quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

A MORTE DA CONSCIÊNCIA (POESIA NO ESTÔMAGO)

“Já ouviu falar daquele louco que acendeu uma lanterna numa manhã clara, correu para a praça do mercado e pôs-se a gritar incessantemente: “Eu procuro Deus! Eu procuro Deus!". Como muito dos que não acreditam em Deus estivessem justamente por ali naquele instante, ele provocou muita risadas... “Onde está Deus!”, ele gritava. “Eu devo dizer-lhes: nós o matamos – você e eu. Todos somos assassinos... Deus está morto. Deus continua morto. E nós o matamos...”

Ano novo. Nada novo. Praça do delírio. Corvo na minha língua. Curvo no seu dorso. Minha saúde ameaçada e isso não é poesia nem viagem literária. É fato. Abandonei o lugar de conforto e vivo submergido nos turbilhões aristocráticos da imobilidade humana. perambulo em infinitos bares, igrejas, reuniões filosóficas a fim de encontrar ventura e abrigo. Tudo que tinha pra dizer já foi dito. Amei. Amei. Ah como amei! Bebi também. Agora quero descansar; um novo lugar... A cerveja gelada no espaço, a agonia esquecida nos botequins da ilusão.

Essa é a última postagem do meu blog. Tudo não passou de águas turvas. Talvez um dia animo e volto a cuspir via rede minhas inquietações... No momento quero encerrar minhas atividades e me entregar ao ócio; -- o capitalismo tolheu meus membros e destruiu todo meu intelecto; não deixarei de escrever, só cansei da exposição e me desnudar por completo dessa maneira tão visual.

Encerro esse blog com um texto do grande poeta marginal Lautréamont:

"Hoje, sob a impressão dos ferimentos que meu corpo recebeu em diferentes circunstâncias, seja pela fatalidade do meu nascimento, seja por minha própria culpa; desalentado pelas conseqüências da minha queda moral (algumas dentre elas aconteceram; quem poderá prever as outras?); espectador impassível das monstruosidades adquiridas ou naturais, que decoram as aponevroses e o intelecto de quem vos fala, lanço um prolongado olhar de satisfação à dualidade que me compõe... e me acho belo! Belo como o vício de conformação congênito dos órgãos sexuais do homem, que consiste na brevidade relativa do canal da uretra e na divisão ou ausência da parede inferior, de modo que o canal se abra a uma distância variável da glande e por baixo do pênis; ou, ainda, como a verruga carnuda, de forma cônica, sulcada por rugas transversais bem profundas, que se ergue na base do bico superior do peru; ou melhor, como a seguinte verdade: "O sistema de gamas, modos e encadeamentos harmônicos não repousa em leis naturais invariáveis, mas é, ao contrário, conseqüência de princípios estéticos que variam com o desenvolvimento progressivo da humanidade e que continuarão variando!"; e, principalmente, como uma corveta encouraçada com torreões! Sim, sustento a exatidão da minha afirmação. Não tenho ilusões presunçosas, orgulho-me disso, e nada ganharia em mentir; de modo que, quanto ao que eu disse, não deveis vacilar em acreditar-me. Pois, como iria eu inspirar horror a mim mesmo, diante dos testemunhos elogiosos que partem da minha consciência?"

Agradeço a todos que leram e comentaram meus textos.
DIEGO EL KHOURI

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

A POESIA COMO ARMA DE REVOLTA



“Poesia é a subversão do corpo”. Nada mais que essa sanguessuga chula de luvas de pelica. Baudelaire nos deu a receita. Olhos embriagados, cabelos em desalinho; a poesia contundente é aquela que absorve no ritmo e na forma uma maneira de contaminar o que já é sujo, ampliando a consciência para novos horizontes, abandonando o que não é sentimento para um movimento que seja apenas emoção, nada de razão.

A poesia sempre teve essa função (se é que tem alguma função) de destruir muros, quebrar tabus, sensibilizar a alma e ferir os inimigos. Assim podemos mudar a visão que se tem de arte – em vez de curar cutucar a ferida - . Desde os trovadores até os fesceninos foi assim. Quando os trovadores eram solicitados muitas pessoas acreditam que era para exaltar a mulher desejada. Mas não. Muitas vezes eram pagos para ridicularizar, satirizar, humilhar algum opositor ou coisa parecida. Por isso Octávio Paz está certo ao mencionar a frase que se encontra no começo desse ensaio. “ A poesia é a subversão do corpo” e o sexo uma válvula de escape fantástica.

Como um megalomaníaco-profeta o poeta se vê naufragado no abismo, um abismo sem volta, perdido e esquecido nos vãos da linguagem. Abstração e delírio. O caminho de Dante nos inframundos mas com as portas do paraíso fechadas. O poeta é um excluído por excelência, um amaldiçoado, entregue à mercê dos carrascos do universo. Dessa fibra que exalta a pele trazendo ao coração pitadas de volúpia e dor. Daí nasce o poema. Desse estado de marginalidade, ou seja, da indignação, resultada do vazio e da brutalidade do mundo pragmático e sobretudo hipócrita. O artista é um ser dilacerado entre os prazeres da carne e a vontade de elevar-se espiritualmente. Assim como o Fausto do Goethe. É um anjo decaído, um insatisfeito de marca maior.

Um bardo sem indignação é como um terrorista sem armas. Não há nenhuma diferença nesses dois lavradores. São todos destruidores. Porcos imundos de uma luxuosidade irônica e cadavérica. Sombras amarguradas de egoísmo e tédio. Passionais místicos, místicos passionais. Filósofos suicidas, rebentos de Nietzche. Palhaços que se mostram e se desnudam e se molestam em praça pública afim de que os demais se regogizem e lancem gargalhadas ao Todo, mostrando que a poesia é um circo de clowns bêbados e sem graça, superiores, medíocres. O terrorista e o poeta: seres de semelhança única, cada um vai desmoronando sua parte. Um no campo objetivo, outro no subjetivo. Porém aquele que verseja é superior. Ele destrói para vislumbrar algo, transcender, elevar a consciência, purificar, mesmo que seja pelas vias sexuais. Caminhar entre o lixo e o luxo. O sublime e o torpe. O carnal e o espiritual. Vivenciar a existência ao lado dos paradoxos.

A arte não constrói nada, apenas destrói matizes. Escrever desesperadamente, desenfreadamente ou perder-se no Nada, fechar os olhos, cessar a voz , o silêncio eterno... Rimbaud no auge dos seus vinte anos de idade abandonou a literatura para viver uma vida aventurosa, conturbada, selvagem e mística. A beleza enviesada e corcunda. A revolta nas artes e sobretudo na poesia é uma maneira de limpar a sujeira vivente, mesmo que seja apenas interior. Em vez de dar a outra face esbofetear o inimigo e cuspir caudalosos caldos de ironia e perversão. Transformar o que é podre em porções sublimes iluminando o mal da face da Terra. Livrar da humanidade todos aqueles que se opuserem as idéias atemporais propostas por Platão. Virtudes, amor, verdade. Eis o que desejamos. Eis o que queremos.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

VERMES NO SOVACO

Enquanto ao cárcere do mundo me limito
em ser apenas um poeta cheio de vícios
me transfiguro, me humilho vendo
sujar minha face as sete chagas de Cristo.

Uma agonia traiçoeira dessas que invadem a alma
brotam no meu peito. Na bronha faleço.
Sei que nada vejo a não ser as chagas
que corroem minha alma, me xingam, me matam.

No mato solitário, no breu e sem cachorro
choro atrozmente como uma criança chora.
Dinheiro, emprego, família, tudo tenho

só a paz que não vejo faz tempo.
Numa necessidade filosófica passo horas a fio
dormindo em ventres desnutridos.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

EJACULAÇÕES POÉTICAS




Desprendendo-se do céu como uma abóboda de reflexos a própria existência ensanguentada enfileirada numa redoma de cristal grita seu último suspiro de paz e ventura rumo aos desejos incertos, o amor distante, a vida além do que se vê. Ninguém move montanhas. Movemos toneladas de concreto com o falo ereto, a mente em frangalho, o peito baleado, a poesia crua e chula contra todas as ordens. Somos o resultado do cansaço, das olheiras fundas devassada sobre livros e livros perdido em coxas lascivas das deusas da noite. Pintor de mão calejada. Alma submersa em volúpia e transgressão. Eis o que a história nos negou. O princípio e o fim. Poeta de chinelo perdendo a compostura, o ritmo e a forma. Há uma certa nojeira em tudo que nos rodeia. Me sinto uma prostituta de marca maior. Uma verdadeira prostituta. Uma puta devassa. Corrupto ladrão dos próprios princípios. Sêmen esgotando a última hora do dia do último mês da última morada de Deus. Percebo que o desespero não será mais um amante no dia que conseguir ler o paraíso de Dante. A última parada dos 3 inframundos. Beatriz sempre será uma ilusão. O inferno é bem aqui. Em minhas vísceras, minhas axilas.

"Ser um homem sério sempre me pareceu algo muito nojento." "Foi pelo ócio que eu, em parte, cresci." Como em um rio turvo na direção contrária com os punhos cortados a frase fixa em meu inconsciente. Vomitar, se expor mostrando todas as chagas, toda a epiderme, feridas que nunca cicatrizam. Que diga a minha barriga! Baudelaire então nem se fale. A embriaguez da humanidade faz festa nas minhas entranhas. Bagos em uso constante. Mergulhar num abismo sem volta. O amor inspira a sociedade e violenta a própria sociedade com suas mentiras e mesquinhez. Dar o cu em troca de dinheiro. Corromper no serviço em troca de dinheiro. Vender-se em troca de dinheiro. Se gentil em troca de dinheiro. Ser sorridente em troca de dinheiro. Mover-se e mover-se em troca de dinheiro, dinheiro, dinheiro. Enfim morrer para que outros vivam. Eu choro enquanto você, caro leitor, ri de minha dor sádica. Cansado. O peso das pálpebras sufoca minha alma. Arranco minhas roupas todas, tenho sede violenta, inunda minha face de lágrimas e tesão; é apenas o sono nas horas erradas. Pintor de mão calejada. Um dia segurarei num pincel sem o peso dos calos... As horas trabalhadas me impossibilita ser um artista plástico equilibrado, sou um excêntrico. Abraçarei minha mãe sinceramente e direi: "TUDO ACABOU! TUDO ACABOU! ESTOU LIVRE!!" e logo perceberei que tudo valeu a pena, que os porres nas noites turbulentas foram apenas doces delírios e os desencontros meros acasos da existência.

Imobilidade. Palavrinha chata essa que me persegue a alguns anos. Tudo se perde no palimpsesto da memória. A unidade. A bela tríade. O kama Manas insano. Filosofias e orgias. Nietzsche em campos devastados. Torres de ametista. Shakespeare e Tati Quebra barraco enterrados no meu âmago. Tornei-me um exímio sadomasoquista. Nada mais me atinge... apenas esse cansaço... esse pungente cansaço... as grades da prisão... esse cansaço... esse cansaço... Se esquecer em infindáveis putarias assim como os feceninos. 6-9 / 6-9. Peito no falo, falo na boca. Punhetas e Kant. Dostoiévski, grande mistério. Escrevo contra o tempo. Contra Deus e contra o homem. Principalmente contra mim mesmo. Deus é a mentira na face da verdade. Com a mão construímos castelos, com a mente destruímos dogmas. João de Aruanda amo-te mais que o vinho, tanto quanto a poesia! A língua ácida-ardente dos malditos. De Bocage a Rimbaud, passado por Baudelaire, Edgar Allan Poe, Bukowski, Mallarmé, Augusto dos Anjos, Allen Ginsberg, Lautréamont, Genet, Gregório de Matos, Byron, Blake... e tantos outros.

"O homem que faz sua prece, pela noite, é o capitão que põe sentinelas. Pode dormir."
Durmo sim... no ônibus, serviço, nos diversos cursos de arte e filosofia, nos bares, zonas vulgares e depois de uma boa trepada!...
Pintor sem mão, poeta sem mente... cansaço me corroendo, destruindo tudo que ainda permanece em pé, intacto.

Poeta de chinelo perdendo o fio de meada.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O "POETA MAIOR" EM RESPOSTA AO "POETA MENOR"

Dois poetas se apunhalando, se desnudando, se revelando. Almas submersas no vazio. Deuses perdidos em volúpia e sarcasmo... Arcanjos suicidas, profetas do caos...
o poeta devassado no caminho... entre uma madrugada e outra, entre um pesadelo e outro, na solitude roubando versos no Nada...

Trocando terríveis experiências, o "poeta menor" revela ao "poeta maior" suas dores, suas loucuras, frustações e seus dias à beira da Morte. O iconoclasta perdido entre a corda bamba do desejo e da espiritualidade. Ser morto na imobilidade da existência humana tendo apenas no amor a linguagem, no delírio, na fuga tão desejada e no sexo a válvula de escape fantástica.

Em resposta ao "poeta menor" o "poeta maior" (Glauco Mattoso) revela sua dor e se diz impressionado ao notar que o rapaz além de insubmisso é um sobrevivente. Glauco nunca teve a experiência de ficar dias com a boca no vaso vomitando, dormindo no banheiro vítima de uma cirurgia errada e de uma existência vã, afundado durante um ano nos braços voluptuosos da Morte. Mas em compensação quantos paus teve que chupar para sasciar a sede de moleques que detinham de uma saúde melhor que a sua? Quantos pés chulepentos lambeu sentido o fedor trespassar por entre dedos de micose? Quanta dor sentiu ao ver apenas a escuridão e nada mais?

Entendo seu desespero, rio de sua dor, me regogizo em sua infinita escuridão...

Eis o email de resposta que esse ladrão das palavras me enviou:

Glauco Mattoso

Enviada:
sexta-feira, 18 de setembro de 2009 5:22:25


Diego, o que você me conta foi dose mesmo. Não gosto de comparar sofrimentos, pois ninguém leva vantagem, mas, se eu passei por umas dez cirurgias com anestesia geral, não cheguei a correr os riscos fatais que você correu; por outro lado, você ainda enxerga. Enfim, espero que você tenha superado esses problemas físicos e mantenha uma saúde minimamente estável. O que posso fazer é isso, continuar lhe enviando livros e zines, que nos permittem viajar e desabafar. Até! GLAUCO

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COMUNICADO À COMUNIDADE

Setembro/2009 - O ensaísta português Pedro Lopes de Almeida, estudioso da obra mattosiana, com quem este poeta mantém correspondência,aproveitou a ocasião, em que o traslado dos restos mortais de Jorge deSenna ocupa o noticiário daquele país, para encaminhar a Mattoso, como refresco da memória, o poema abaixo, que obviamente não poderia escapar a uma parafrase em soneto, colada logo a seguir.

O DESEJADO TÚMULO

Numa azinhaga escura de arrabalde
haveis de sepultar-me. Que o meu túmulo
seja o lugar escuso para encontros.
Que o jovem desesperado e solitário
vagueando venha masturbar-se alí;
que o namorado sem um quarto aonde
leve ao castigo a namorada, a traga
e a force e a viole sobre a minha tumba;
que o invertido venha ajoelhar-se
à beira dela ante quem esperma vende,
ou deite abaixo as calças e se entregue,
as mãos buscando apoio nessa pedra.
Que bandos de malandros alí tragam
a rapariga que raptaram, e
a deixem la estendida a escorrer sangue.
Que as prostitutas reles, piolhosas,
na lage pinguem corrimentos quando
a pobres velhos se venderem lá.
E que as crianças que brincando venham
jogar à minha volta, sem pisar nos cantos
a trampa mais cheirosa do que a morte
e que à memória humana de azinhagas,
alí descubram, mal adivinhando,
as nódoas secas do que foi violência,
ou foi desejo ou o que se chama vício
e as lavem rindo com seu mijo quente
a rechinar na pedra que me cobre
(e regressem um dia a repetí-las).

25/12/1970

Jorge de Senna (in "Visão Perpétua", 1982)

SONETO PARA OS RESTOS DE JORGE DE SENNA [17/9/2009]

No túmulo em que Senna está sepulto
quer ele que o moleque toque bronha,
que o namorado de castigo ponha
a moça, alí estuprada sem indulto.

Que o puto chucro e que o malandro estulto
alí forniquem sem sequer vergonha.
Que alí se beba e fume até maconha.
Que o satanista faça alí seu culto.

Mais pede Senna aos vivos: que a criança
vadia nessa pedra deite o mijo,
zombando de quem nunca alí descansa.

Com ele estou de acordo! Eu próprio exijo
na lápide que deixem, de lembrança
gravando, a sola suja e o falo rijo!

GLAUCO MATTOSO

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domingo, 25 de outubro de 2009

"POETA DE CHINELO"



Fico grato pelo poema dedicado a mim. valeu mesmo Ivan. Receber um poema criado pela mente fantástica do rei das metáforas é muito gratificante. Melhor definição que já fizeram de minha poesia: "poeta de chinelo" . Concordo plenamente (risos). Valeu!!

O Poeta

[ao Diego El Khouri]

No mundo da alucinose
não tem o quê e nem o onde
crianças giram no carrossel
a noite é o próprio céu

Da conserva concentrada
o porre doce-amargo
não é nada de bebida
é o uno gosto da lume

O lustre do saguão, todo amarelo
"Olha lá, o único de chinelo"
Desinibido pela vida, embalsama o quimero

O mórbido embrião
Suicída!--escuta quieto,
--o instinto de quem tem a vida--
O Poeta de chinelo.
(Ivan Silva)

MELODIA SERENA

Ouço um som suave...
Um suave som pela madrugada...
Som translúcido, diáfano
que me corta a alma...

Um som mudo, calado;
- canto orquestral de orgasmo -
cabeça leve, olhos parados...
Que som estranho é esse que invade a alma?

Ó Deus dos reinos incertos
trazei aos meus olhos
a forma real dessa melodia serena.

O canto dos pássaros
o gemido dos corpos eretos
penetrando sem dó na noite intensa.
14,08,2008

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